
Com um crescente número de adeptos nas duas últimas décadas, o microconto ou miniconto, é utilizado em muitas coletâneas nos dias atuais. Mesmo não sendo reconhecido como gênero literário, grandes nomes da literatura mundial já publicaram micronarrativas, entre eles, Ernest Hemingway. No Brasil o pioneiro foi Dalton Trevisan com o livro “Ah, é?”, de 1994. Eu, particularmente não gosto deste tipo de narrativa, mas venho praticando nos últimos meses, para me adequar a algumas antologias que tenho participado. Abaixo, no curto conto, mostro a dificuldade de ser escritor num país de poucos leitores.
Artigo 528
Toni Ramos Gonçalves
Saímos juntos da sala de audiências, logo depois da sentença do Juiz. Decretara a minha prisão pela falta de pagamento dos alimentos devidos à minha filha, no prazo de 72 horas. Andávamos os dois para o ponto de ônibus. Eu ia mais lento, quando resvalei a frase descabida:
“Precisava me levar à justiça? Eu não te disse que estava quase terminando o livro, que vai me dar um bom dinheiro?”
“Esquece isso, homem. Você ganhou um prêmio literário e foi só. Você não tem leitores, aliás, no Brasil ninguém lê… E mais… Não é o seu dinheiro o que mais me faz falta durante todos estes anos. Na realidade, você nunca foi nem meu, nem de nossa filha e, certamente, nem de você mesmo. É uma pena que não tenha percebido isto a tempo.”
Chegamos à esquina e fomos envolvidos pela multidão que atravessava o sinal. Distanciamos sem querer, ambos ainda acenando discretamente, sem que ninguém percebesse as lágrimas em nossos rostos. Olhamos com tristeza até que a distância não mais o permitisse. Não queria ir para casa. Atravessei a rua com pressa com que despencara meu coração e fui andando, sem pretensões de alcançar lugar algum.
Para saber mais sobre microcontos visite a seguinte página: https://www.revistabula.com/1787-30-contos-de-ate-100-caracteres/